15/05/06

Velhice

No espaço de uma semana, ouvi falar de dois casos de idosos que adoeceram gravemente em casa. Viviam ambos sozinhos e, ao que parece, ninguém deu pela falta deles durante alguns dias. Um já estava morto quando o encontraram. O outro foi para o hospital depois de uma complicada operação por parte dos bombeiros para entrar por uma janela alta. Fiquei a pensar no assunto. Que espécie de filhos e netos somos nós? Que mundo é este que bate recordes de SMS nas passagens de ano mas não comunica com os seus velhos? Que ciência é esta que se orgulha de aumentar todos os dias a esperança média de vida sem que haja condições para que ela termine com dignidade? O que são as rugas, as falhas de memória, as limitações físicas, as baixas reformas ao pé da angústia de adoecer ou morrer na mais completa solidão?

16 comentários:

_+*Ælitis*+_ disse...

Ainda hj falava sobre isso com uma amiga que trabalha no sistema de seguranca social ai em Portugal.A Situacao esta pessima e é de partir o coracao.

Beijos

Anónimo disse...

Desculpe lá, os SMS comunicam alguma coisa ou, por outras palavras, chama «comunicação» àquilo?

Anónimo disse...

É absolutamente angustiante e assustador. Estamos a construir uma sociedade cada vez menos solidária.

Araj disse...

A minha avó contava uma história em que as pessoas antigamente levavam os velhos ao monte e os deixavam lá. Será que hoje não estamos a fazer o mesmo. Entregamo-los a instituições para cuidarem deles e nunca mais queremos saber

tulipa_negra disse...

por acaso isso de que "falas" dá que pensar e assusta imenso. o desenvolvimento das tecnologias parecem trazer consigo (infelizmente) o egoísmo...

Anónimo disse...

Já repararam vocês todos aí atrás,e muitos muitos outros da vossa idade, que chegará também o vosso dia ?
Vamos então ,começar já o exercício. Que tal telefonarem aos vossos pais,avós, tios, tias,... só para dizer olá.
Um dia destes estava ao telefone com um amigo que está a viver em Espanha e perguntei-lhe se ele ligava com frequência aos pais. Respondeu-me que estava tudo bem e que eu era uma exagerada. Terminada a conversa e ao fim de uns minutos. telefonou-me de novo desta vez para me agradecer. Perguntei-lhe porquê e ele respondeu-me : - sabes, fiquei a pensar no que disseste e resolvi telefonar á minha mãe só para lhe desejar um bom dia. Ela ficou tão feliz, por esta atenção inesperada, que tenho a certeza teve um dia diferente , e eu, também.
Eu sei que ás vezes existem casos dificeis,mães,pais, tios, avós que " colam " no telefone, mas nós podemos sempre gerir a situação...não acham?
Para que a idade boa para viver não seja só a "idade do meio" porque se notarem as crianças e os velhos são sempre quem mais sofre.

Custódia C. disse...

E às vezes é tão fácil e basta tão pouco!
E é mesmo como diz a Tó, também pode chegar o nosso dia e aquilo que hoje fazemos, ou não, pode ser exactamente aquilo que poderão fazer por nós, ou não!

Out of Time disse...

A sociedade de consumo até nisso se revela, tudo tem de ser novo e perfeito, não há lugar para as "antiguidades". Os meios de comunicação resolvem parte do problema, mas não assimilam a sabedoria e a contemplação que se ganha com a idade.

L. Rodrigues disse...

Sempre que posso certifico-me de que os meus sobrinhos me amam. Pode ser que resulte.

João Silva disse...

Ao ler este post não resisti a partilhar um dos textos que mais me emocionou um dos que penso ser mais belos e sóbrios dentro dos que conheço. (escrito por José Saramago...quase de certeza!)
Acreditem que vale a pena gastar 3 minutos a ler isto...

"Carta para Josefa, minha avó


Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo – e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal! Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira – sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.

Não sabes nada do mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião. Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com isto viveste e vais vivendo. (...)tens grandes ódios por motivos que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma.(...) Da fome sabes alguma coisa: já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja. (Contaste-me tu, ou terei sonhado que o contavas?...) Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém.

Estou diante de ti, e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este mundo e não curaste de saber o que é o mundo. Chegas ao fim da vida, e o mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não fazia parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal, a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha vã e chão de terra batida. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos,(...) – e continuo a não entender. Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Porque foi então que te roubaram o mundo? Quem to roubou? Mas disto entendo eu, e dir-te-ia o como, o porquê e o quando se soubesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti – e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava.

Não teremos realmente? Eu não terei dado, porque as minhas palavras não são as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa, de que me não acusas – e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, porque te sentas tu na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes, com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: «O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!»

BAd disse...

Há tantos casos assim que até mete medo.
Da minha parte tento fazer pelos meus o que está ao meu alcance.
Se cada um fizer o seu bocadinho.... já não é mau.
Beijinhos

marta r disse...

João: obrigado pelo teu texto. Percebo perfeitamente porque é que é um dos teus preferidos. Vou guardá-lo.

Sendyourlove disse...

infelizmente o mundo egoista que temos

Isabela Figueiredo disse...

Sim, tens razão. A sociedade tem de pensar nos velhos. Eu, tu e todos os que andam por aqui.

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

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