12/04/06

Desabafo de uma amiga

«Há uns tempos, por força de circunstâncias profissionais, cruzei-me com uma mulher de 40 anos, brasileira, ex-gerente de um bar de alterne na cidade das mães, católicas, apostólicas, que vão ao domingo à missa. A mulher, bonita, mas já com alguns sinais de quarentona - e se tem essa idade qual é o problema? – numa situação de desespero, confessou-me que temia pelo seu futuro. Sem trabalho, sem documentos (estes foram apreendidos pelo tribunal na sequência de um processo de investigações), disse-me que cada dia que passa perde uma oportunidade na vida. E porquê? “Porque tenho mais um cabelo branco, uma ruga, em suma estou-me tornando velha”, lastimou. No entanto, referiu que se sentia cheia de vida, que o seu interior era o de uma jovem de 18 anos. Pronta para tudo, para trabalhar, para mudar de profissão, para enfrentar o preconceito.
Andei uns tempos a mastigar o assunto. Aquela mulher não era velha… tinha 40 anos.
Esta semana deparo-me com o preconceito às sub-30. Vou a caminho dos 35, solteira, independente. Estou segundo as regras da nossa sociedade ultrapassadíssima. Senti-me velha pela primeira vez na vida quando entrei num banco para pedir um crédito à habitação. Quando a funcionária, também uma mulher, mas a caminho dos 50, ou mais, torceu o nariz quando lhe disse a idade e o estado civil. “Já não é jovem portanto é tudo mais difícil e sozinha”, atirou por cima do balcão. Defendi-me. Perguntou-me se era enfermeira. “Eu não, porque raio havia de ser enfermeira”, retorqui e acrescentei “sou jornalista”. Pior… novo franzir do nariz, desta vez mais forte e acompanhado de um Ui!!!! Sonoro… estridente. “É pena, ia para os 360, assim não”. Que raio serão os 360? Os clientes VIP!!!?
Admito que sai do banco de rastos, sem vontade nenhuma de fazer a aquisição do apartamento, e com vontade de ir para outro canto qualquer do globo, montar a barraca. Considerada velha, apesar de não ter ainda rugas e estar em forma graças ao vicio de fazer exercício físico, com uma profissão sem estatuto, sem um vencimento chorudo, solteira, sem dois filhos, um duplex, um automóvel GTi, um cão e um ar de falsa felicidade, não interesso ao banco, nem à funcionária do banco. Já sou obrigada a enfrentar o assédio dos machos da rua onde moro, que, só porque vivo sozinha, pensam que estou disponível… as críticas dos ex-namorados que quando acompanhados das jovens esposas, ou namoradas, fazem apreciações ao meu estado civil. E agora a mulher do banco!
Pela primeira vez compreendi porque razão algumas mulheres escondem a idade em termos sociais, o motivo porque algumas fazem figuras ridículas, muitas vezes, ao tentar meter-se em roupas que não as favorecem de todo, só para parecerem mais jovens. Então, não temos direito a escolher a nossa própria vida? Temos de seguir os estereótipos da publicidade da TV…Precisava de desabafar».
Glória

6 comentários:

tulipa_negra disse...

isto dos bancos tem muito que se lhe diga (já gora os 360 meses referem-se à duração do empréstimo - neste caso 30 anos)... aconteceu-me algo pior. tinha eu 26 anos (!), fazia parte dos quadros da empresa e a gerente do banco atirou-me à cara que dar o crédito estava complicado porque eu não tinha uma situação profissional estável... ainda lhe atirei à cara que se eu podia ser despedida a qualquer momento, ela também... a única diferença é que eu tinha 26 e ela já passava dos 40... mudei de balcão e nunca mais lá pus os pés!

nspfa disse...

tb n percebi porque lhe perguntou se era enfermeira, mas palpita-me que seja pela quantidade de enfermeiras solteiras e sem filhos aos 30 e tal anos. E isso é verdade

Anónimo disse...

bancos bancos aquelas igrejas ridículas para lidar com eles só mesmo armado(a)e pronto ao assalto !
É de evitar! Raramente lá vou.

João Silva disse...

Numa coisa a senhora(entenda-se cabra) do banco tem razão... Enfermeiros e Jornalistas, uiiii é gente que não interessa a ninguém!
eheheh

Anónimo disse...

Enfermeiros e jornalistas é gente que não interessa a ninguém. ah ah ah ah ah. Que bizarro

Anabela disse...

Em tempos, um professor universitário vomitou esta pérola: "o ser humano entra em declínio a partir dos 30"

Eu, que me sento sempre na primeira fila, fiquei a olhar para ele, com cara de parvalhona à espera de uma explicação mais plausível que não a de "que são as mulheres, o melhor exemplo desta afirmação", disse ele.

O professor era padre... coitado dele! O que saberia ele do declínio do ser humano, se, e principalmente, não conhecia o auge do ser humano.

Os porteguesismos facciosos são essencialmente herança do pensamento pequenino, do pre-conceito.

A felicidade nada tem a ver cpom o facto de estar casada, ou solteira... tem a ver com as suas opções de vida e como convive com elas.

Ps: para a sua casa nova, boa sorte. Não compre é cães de loiça...